13.6.11

Diminuto.


Aquela camiseta branca que ela vestia com certeza já vivera épocas melhores; mas, aos olhos dele, parecia simplesmente perfeita enquanto adornada com marcas em formato de dedos na cor lilás. A calça jeans não existia mais, posto que havia sido cortada apressadamente mais ou menos na altura da junção das pernas dela. Quase curto demais, na opinião dele. Quase, porque não havia ninguém mais na casa. Quase, porque ele já tivera a oportunidade de observá-la com muito menos roupa no corpo. Quase, sim. Mas, quando fossem embora, ele certamente insistiria em cobri-la um pouco mais. No que dependesse dele, nenhum outro homem teria jamais o privilégio de vê-la tão nua, tão descontraída, tão vivaz e adorável.
Ele lhe observou os cabelos, presos tão negligentemente que deixou um traço de sorriso nos lábios dele. Observou-lhe os movimentos repetitivos dos braços bonitos e também a mania que ela tinha de ficar na ponta dos pés, ainda que o local que iria receber a pintura não fosse tão alto assim. O movimento do corpo pequeno levou o olhar dele às unhas dos pés, pintadas de rosa. Para ela, seria... Como era mesmo? Rosa bebê ou alguma coisa parecida. Para ele, era apenas rosa. Não entendia nem metade desse universo feminino tão complicado, mas adorava ver que ela se movimentava por esse mundo sem problemas.
Adorava a feminilidade dela. Sentia que essa característica de mulher apenas fazia dele mais homem. Os contrastes eram maravilhosos de se ver. E ele via. Demorara um certo tempo, claro, já que a teimosia era tão sua quanto aqueles quadris eram dela. Os mesmos quadris que agora balançavam ao som da música animada. Certo, já era hora de que ela soubesse que estava de volta. Do contrário, aquela parede continuaria indefinidamente sem cor.
- Cheguei.
Ela soltou imediatamente o pincel, mas sem nenhum sobressalto. Sentia-se segura naquela casa.
- Ainda bem, estou morta de fome.
- Não demorei muito, demorei?
- Só o suficiente pra minha barriga começar com as reclamações - sorriu ela enquanto caminhava até ele, pegando a bolsa de papel que ele lhe estendia.
- Também tive a companhia da minha no caminho de volta - ele brincou. - Vem aqui.
Ele a segurou pela mão e a levou para o canto cuja pintura haviam terminado aquele mesmo dia pela manhã. Aquela tinta era realmente ótima, ele se disse, quando já estavam sentados e apreciando o jantar. Não havia nenhum odor desagradável pairando no ambiente. Claro que as janelas estavam totalmente abertas, mas, se a tinta fosse outra, isso não adiantaria nada.
- Hum... Que gostoso.
- Mata a fome - ele deu de ombros e a fez rir.
- Quando você vai finalmente assumir que gosta das delícias que a comida rápida nos proporciona?
- Nunca?
- Não sei, não... Mas você parece estar adorando esse hambúrguer.
- Não mais que você.
- Ah, isso não mesmo - sorriu ela. - Mas pelo menos um pouco, certo?
- Okay. Um pouco.
- Ótimo - sorriu ela de novo.
- Como você adora ganhar uma discussão - comentou ele.
- Não. O que eu adoro é ver você mudando seus hábitos por minha causa - brincou ela.
- Que mulher estranha. Você não diz que me adora do jeito que eu sou? Por que tenta me mudar?
- Não tento. Mas gosto quando você muda.
- Hein!?
- Diz se você não gosta quando percebe que eu mudei, de alguma forma, por influência sua?
- Não.
- Aham. Mentiroso. Você adora quando eu pinto minhas unhas de vermelho sangue.
- E de que maneira isso foi influência minha? Não tenho vocação pra Drag Queen, pequena.
Ela imediatamente gargalhou, como ele pensou que aconteceria. Adorava ouvir o som daquele riso enquanto também podia vê-la. Às vezes, quando falavam ao telefone e ela sorria da mesma forma que naquele instante, ele sentia que estava perdendo algo, simplesmente porque não podia ver todo o quadro que ela pintava com um só riso. Os olhos brilhavam de forma diferente e até o rosto dela adquiria uma expressão mais sublime. Era fascinante. E, ao mesmo tempo, aterrador. Odiava ser tão vulnerável assim àquela mulher. Odiava perceber tantos detalhes e odiava ainda mais o desejo de continuar percebendo-os, dia após dia, infinitamente. Odiava, mas também amava. E isso mudava tudo.
- Você não presta. Mas, sério, não lembra que um dia você viu aquela modelo... como era mesmo o nome? Enfim, ela estava com as unhas pintadas de vermelho e você comentou que isso era muito sexy. No dia seguinte, eu pintei as minhas unhas de vermelho pela primeira vez na vida!
- Por mim? Agradecido. Realmente é sexy. Mas eu não me lembro disso.
Ela olhou para o teto antes de voltar a encará-lo. - Homens - exclamou.
- Mulheres - devolveu ele, no mesmo tom implicante. - Quando você vai entender que minha memória é seletiva? Não preciso me lembrar desse acontecimento em particular pra saber que adoro suas unhas pintadas de vermelho.
- Seria mais legal da sua parte se você lembrasse. Como eu lembro.
- Ponto pra você, então.
- Chato.
- Ouço essa palavra direcionada a mim com tanta frequência que já se transformou em um elogio.
- Vou pensar em outra, equivalente, então.
- Aposto cinquenta centavos como você encontra dez outras.
Novamente, ela riu. E, novamente, ele se sentiu completo. Olhou ao redor, enquanto terminava o jantar improvisado, e respirou fundo. Aquela casa demoraria ainda certo tempo para ficar pronta. Mas não havia pressa. De minuto em minuto, o mundo inteiro estaria esperando por eles. Porque o mundo inteiro estava logo ali... Bastava estender os braços.

2 comentários:

  1. amor. simples, cotidiano, do jeito que deveria ser pra todo mundo.

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  2. Cúmulo da fofura.
    Aquela estória que pode ser de inúmeros casais, mas nos faz remeter àqueeele que é o xodó.
    Admiro quem consegue escrever uma história de um casal em tão "poucas" linhas. Pq só de sentirmos a essência, já podemos ter noção da história, das pessoas...
    Aaaaahhhh enfim, amei, amei e amei! Há mto tempo não lia um conto(?) com um sorriso tão sincero nos lábios.
    Parabéns, Bru.

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